Preto e Branco

*Trilha sonora ali embaixo!
Maravilhoso Luis Fernando Veríssimo! Acho que esses autores resolveram ler minhas entrelinhas esta semana…e eu que pensei que só eu tinha essas contradições…
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“Um palco vazio. Entram dois homens, um vestido de preto e outro de branco…
Homem de Branco: Preto.
Homem de Preto: Branco.
Branco: Por que não uma mistura dos dois?
Preto: Vem você com essa absurda mania de conciliação. Essa volúpia pelo entendimento, essa tara pelo meio-termo!
Branco: Se não fosse isso nós não estaríamos aqui. Foi minha moderação que nos manteve longe de brigas. Foi minha ponderação que nos preservou. Se eu fosse atrás de você…
Preto: Nós teríamos vivido! Pouco, mas com um brilho intenso. Teríamos dito tudo o que nos viesse à cabeça. Distinguido o pão do queijo com audácia. Colocado pingos destemidos em todos os “is”. Dado nome e sobrenome a todos os bois!
Branco: Em vez disso fomos civilizados. Isto é, contidos e cordatos.
Preto: E temos os tiques nervosos pra provar!
Branco: VOcê preferiria ter dito a piada que magoaria o amigo? A verdade que destruiria o amor? O insulto que nos levaria ao setor de traumatismo do Pronto Socorro?
Preto: Preferiria. Para poder dizer que não me calei. Pra poder dizer: “Eu disse!”.
Branco: Ainda bem que não é você que manda em nós!
Preto: Não, é você. Sempre fazemos o que você determina. Ou não fazemos. Não dizemos. Não vivemos! Estou dentro de você, fazendo, dizendo e vivendo só em pensamento. Se ao menos eu pudesse sair aos sábados…
Branco: Pra que? Pra nos matar? Pior, pra nos envergonhar?
Preto: Melhor se envergonhar pelo dito e o feito, do que pelo não dito e o adiado. Você sabe que cada soco que o homem não dá, encurta a sua vida em 17 dias? E, cada vez que um homem pensa em sair dançando um bolero pela rua e se controla, seu fígado aumenta? E cada…
Branco: Bobagem. Ainda bem que eu sou o verdadeiro nós.
Preto: Não, eu sou o verdadeiro você.
Branco: Você só é nós em pensamento, você é a minha abstração.
Preto: Sou tudo o que em nós é autêntico. Ou seja: Você é a minha falsificação.
Branco: Mas quem aparece sou eu.
Preto: Então o que eu estou fazendo neste palco? E ainda por cima de malha justa?
Branco: Você só está aqui como uma velha tradição teatral, o interlocutor providencial. Um artifício cênico para o Autor não falar sozinho.
Preto: Quer dizer que eu só entrei em cena pra dizer…
Branco: Branco. E eu…
Preto: Preto. Por quê?
Branco: Pra mostrar à platéia que todo o homem é a soma ou a mescla, das suas contradições. Que no fim o destino comum de todos não é ser branco, nem preto, é ser cinza. E não estou falando em cremação.
Preto: Mostrar a quem?
Branco: À pla…Onde está a platéia?
Preto: Foram todos embora.
Branco: Porque não entenderam o nosso diálogo?
Preto: Porque entenderam. Eu não disse?”

Uma resposta

  1. legal de mais

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